14 novembro 2006

Porque estamos numa de fotografias...

Em seguimento do post '' Falemos então de fotografia'' eu resolvi inserir no tema uma série de fotografias que tem como tema as Colónias portuguesas em Africa e na Asia.


As fotos aqui expostas estiveram presentes numa exposiçao no Porto em 1934 e são da autoria de Domingos Alvão.
Esta exposição gerou uma elevada curiosidade na comunidade portuguesa visto que foi visitada por mais de 1 milhão de pessoas.

Agora as fotos.
Guiné. Aldeia de Bijagós

Guiné. Rosinha e Inês, raparigas Balantas

Angola. Rapariga do Quipungo


Mascote do Regimento Landim

14 comentários:

Anónimo disse...

as fotos são muito eloquentes. elas preservam um olhar colonial, um ponto de vista do explorador perante o exótico dos corpos, a estranheza das habitações e a farda europeia, o gesto militar desfazado...
o polido preto e branco assegura a irrealidade do instante captado. como deve ser!

Lu disse...

Nenhum de vocês foi vititar a a exposição "World Press Photo"? Fui e gostei bastante!... Se foram podiam comentar (se não foram acho que não perdem nada em ir ao site).

Quanto ao post, não sou grande especialista em fotos.. mas ponho uma questão no ar: Se vocês gostam tanto de fotografia, nomeadamente tu, David, porque não se tentam re-abrir a sala de Fotografia?

Gosto do vosso blog! Continuem =)

David Gonçalves disse...

Embora viva perto do fórum da Maia, ainda não fui ver a exposição. Incrível não é???

Quanto a sala de Fotografia... nem sequer sabia que existia uma na escola...
Mas é uma coisa a pensar.

Obrigado pela dica...

Voltaire disse...

Também não sabia da existência da sala de fotografia...


Quanto ao post:

O meu avô, na altura com 41 anos, fez parte do tal milhão pessoas que foi ver a exposição de 1934...pelo que me é dado a saber achou a organização e o conteúdo de tão boa qualidade que o visitante saia de lá com a sensação de ter estado em cada uma das colónias portuguesas...

Anónimo disse...

Em 33 surge a designação de "Império Colonial Português". Nós, tão orgulhosos com o nosso 'império'! No fim da 2ª Guerra Mundial, a maioria das grandes potências dá independência às suas colónias, excepto quem? Nós, tão orgulhosos! Somos tão grandes! Uhuhuhu! E quando a pressão internacional se começa a marcar, o que faz o nosso belíssimo estadista Salazar (em 1961)? Altera essa designação para "Províncias Ultramarinas". Tão mais sonante, não é? Fica bem! Deixam de nos chatear por uns tempos, ao menos! E, entretanto, por lá, nas nossas províncias eles vão-se matando. Chacina de tribos, morte dos 'nossos' soldados, traumas, traumas, traumas. E por cá? Oooh, "tudo controlado" refere a 'imprensa'! "São apenas pequenos rebeldes, ladrõezecos, como os há em todo o mundo." E as notícias vindas de África informam-nos de investimento na educação, de melhoramento de infra-estruturas, construção de casas e edifícios, etc etc. Tudo tão pacífico! Até que... *crash*... 25 de Abril de 74! Finalmente! (já não aguentava mais este meu sarcasmo reles. Pseudoironia! bah)



Aparte esta História toda, gosto das fotografias. Gosto de ver rostos, corpos, em imagem. O problema será talvez o propósito dessa exposição... "Elevar o nacionalismo português"? "Mostrar os naturais das áreas colonizadas como seres inferiores a nós e claramente necessitados do nosso apoio em termos de civismo e progresso"? Exagero? Talvez... Mas muitas das fotos do World Press Photo também são bonitas e mostram uma realidade terrível. O mundo é feio e isso acaba por se tornar na sua própria beleza.



(aconselho o filme "A Costa dos Murmúrios" de Margarida Cardoso, com a belíssima Beatriz Batarda, romance adaptado de Lídia Jorge, sobre as nossas colónias e a guerra colonial. banda sonora fantástica!)





[em relação à sala de fotografia.. sim, realmente existe. antes, havia um grupo de fotografia lá na escola. só que, entretanto, o professor responsável foi embora e nunca mais ninguém mexeu naquilo. eu já falei com a presidente do conselho executivo sobre essa questão e ela disse que era perfeitamente viável recuperar tudo aquilo. aliás, essa era uma das propostas de uma das listas concorrentes à AE: reabertura do grupo de fotografia só que houve uns contratempos ainda um pouco indefinidos, que não são para aqui chamados. moving on... peguem nisso, pah! eu ajudo.]

Pablo Chicasso disse...

ok. eu tb nao sabia dessa sala. tem piada mas axo k ng se deve ter lembrado de informar os alunos de artes da sua existencia... (às vezes também tenho a sensação que, por sermos uma minoria, só se lembram de nós para nos pedir um cartaz para isto ou um trabalho para aquilo. Enfim, somos pau para toda a obra...)

Mas adiante que atrás vem gente.

Não partilho a mesma visao destas fotografias. Não vejo frieza nem opressão nem crueldade. bem pelo contrário... são a admiração pelo exotico e pela pluralidade de culturas. a afirmar isto mesmo, aparece a última foto, que realça o anaculturalismo que não há nas outras. (anaculturalismo era para ser uma palavra com o mesmo conceito de anacronismo mas referente a culturas. existia ou foi invenção minha?)

Anónimo disse...

Não, não se vê frieza, nem opressão de liberdades, não. Não se vê nada disso. Muito pelo contrário, vê-se o calor de um povo, o ar pacífico, um aroma de felicidade (posso até dizê-lo [?]). Claro que se vê isso. Não convinha mostrar o oposta. Não convinha.

Anónimo disse...

Joana! Hello!!
Will you please slow down!
Por favor vai mais devagar. E ordena melhor o que queres dizer...
Nós tão orgulhosos com o nosso 'império'... Olha lá Já cá estavas em 33 para poderes dizer nós?
E depois há isto: ainda hoje, depois de terem descolonizado - CONTRA A SUA VONTADE - os ingleses ainda se sentem "muito orgulhosos" da sua COMMON WEALTH" que mais não é - em muitos casos - que neo-colonialismo.
E os franceses tiveram os seus problemas, nomeadamente na Argélia. E ainda hoje andam a tecer influências de dominância das mais variadas formas. E por acaso já ouviste falar do Vietname? Sabes que foi uma colónia francesa (onde, por exemplo, nasceu a Marguerite Duras, já para não falar do seu primeiro (e um dos primeiros no Mundo) ministro da cultura?
E, depois, faz o favor de ter cuidado para não generalizar....
Uma coisa é a classe dirigente e outra coisa é o pobo (o povo diz "o pobo").
TODA A GENTE gosta de coisas que a/o façam sentir bem - ser mais bonito, mais rico, mais inteligente, mais forte, mais atraente.....
Por isso os políticos apostam em coisas que nos façam sentir bem (por exemplo: quem agora está na moda é o Scolari) - Mas debater como e para que se faz isso não é tema daqui e de agora.
Naquela altura (em que até os jornais diários chegavam no dia seguinte a terras a bem poucos quilómetros daqui do Porto...) o que havia à mão para por o Povo a sonhar era o império.

Quanto ao colonialismo - a miscenização que os portugueses fizeram em toda a parte mostra que as pessoas vêm outras pessoas.
É claro que há pessoas e pessoas.

Infelizmente tenho de me ausentar agora e não posso concluir. Tentarei voltar ao assunto mais tarde.

Pablo Chicasso disse...

Ó Joana tens de ver mais do que isso. durante a ditadura, nem todos eramso ditadores. O Alvão não mostra o que não convem. O Alvão mostra o que lhe interessa. E se alguma coisa fica por fixar no negativo é porque não lhe interessa fazê-lo.

bjs.

Anónimo disse...

Especialmente dedicado à Joana, um Poema - de que darei o Título e o Autor num próximo comentário - porque me parece especialmente adequado para se reflectir sobre
<1> a Observação;
<2> a "Neutralidade da Observação"
<3> a Informação - a que é recolhida, a que é trabalhada (não digo manipulada, porque conto trazer aqui exemplo(os) sobre isso e porque a palavra pode (neste contexto) ser mal interpretada), a que é apresentada (=fornecida=transmitida) a que é recebida e a que é apreendida (percebida/percepcionada)
Et altri

E deixar um pedido/desafio à Joana

O que é que o repórter fotográfico do poema quereria mostrar, porquê e com que finalidade(s) ...


O repórter fotográfico
foi ver a fuzilaria.
Ganhou o prémio do ano
da melhor fotografia.


Notícias não confirmadas
informam, de origens várias,
que as tropas revolucionárias
recentemente cercadas
acabam de ser esmagadas
com perdas extraordinárias.


Na redacção do jornal
corre tudo em sobressalto.
A hora é sensacional.
Toda a gente dormiu mal,
gesticula e fala alto.


Passageiros recém-chegados
do lugar da revolução
viram dúzias de soldados
prontos a ser fuzilados
e muitos já arrumados
e amontoados ao chão.


Agora que se anuncia
já estar regulado o tráfico,
inda mal rompera o dia
foi ver a fuzilaria
o repórter fotográfico.


Vá lá, vá lá, felizmente,
felizmente que ao chegar
inda havia muita gente
que estava por fuzilar.


Numa ridente campina
de papoulas salpicada,
um sol de lâmina fina
cortava a densa neblina
da metralha disparada.


Berrando como vitelos
a malta dos condenados
avançava aos atropelos
e arrepanhava os cabelos
com gestos alucinados.


O repórter já suava,
não tinha mãos a medir;
ora a máquina carregava,
apontava e disparava,
ora no chão se agachava,
pulava e gesticulava
com afanosa presteza.
Há empregos, com franqueza,
nem haviam de existir.


A um tipo de mãos nojentas
que aos berros sobressaía
gritando frases violentas,
focou-o mesmo nas ventas
no momento em que caía.


Mas o melhor não foi isso.
O melhor foi uma velhota
que pôs tudo em rebuliço.
Rápida como um rastilho,
em convulsivos soluços,
foi estatelar-se de bruços
sobre o corpo do seu filho.


— Meu menino, meu menino!
Valha-me a Virgem Maria!
Que vai ser o meu destino
sem a tua companhia?!
Mataram-me o meu menino!
Filho do meu coração!
Que vai ser o meu destino
sem a tua protecção?!


Nunca uma cena de horror,
uma tragédia tão viva,
tão grande expressiva dor,
alguém teve ao seu dispor
defronte duma objectiva.


Era uma face crispada,
um olhar perdido e louco,
uma boca de xarroco
em lágrimas ensopada.


Foi uma sorte, realmente.
Um desses casos notáveis,
bestiais e formidáveis
que acontecem raramente.


Aquelas faces crispadas
correram pelo mundo inteiro
nas revistas ilustradas,
em tiragens esgotadas
que deram muito dinheiro.


Com aquele sentido humano
da justiça e da harmonia,
o repórter todo ufano,
ganhou o prémio do ano
da melhor fotografia


E, de balanço, lembrei-me de uma poesia do Álvaro de Campos que é um verdadeiro tratado de epistemologia das Ciências de que só me lembro este bocadinho:

É preciso abrir a janela...

Vou tentar localizá-lo entre os meus livros ou, quem sabe, na Net...

Anónimo disse...

A Net é bestial!!!....

Nem precisei de me levantar para descobrir que estava errado e para encontrar o tal poema do Alberto Caeiro que é para ler devagarinho e "mastigar" muito bem...

o poema afinal diz muito mais do que "é preciso abrir a janela".
Na verdade, pensando um bocadinho conclui-se com facilidade que "não basta abrir a janela". Aqui vai

NÃO BASTA ABRIR A JANELA

Não basta abrir a janela
Para ver os campos e o rio
Não é bastante não ser cego
Para ver as árvores e as flores.
É preciso também não ter filosofia nenhuma.
Com filosofia não há árvores: há ideias apenas.
Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;
E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse
Que nunca é o que se vê quando se abre a janela.

Alberto Caeiro - Poemas Inconjuntos

Saboreiem.....

Anónimo disse...

Joana! Hello!!

Que pena tenho de ter interrompido o meu comentário anterior, e por tanto tempo....
Agora é-me impossível retomar o fio à meada.

Mas, como me lembro que disseste noutro comentário que andas a ler Fernando Pessoa, lembrei-me de um poema que reli, por tua causa..., e que me parece adequado, e, mais que isso, diz muito melhor quase tudo o que te queria dizer O poema não é do Fernando Pessoa - é do Alberto Caeiro:

O que nós vemos das coisas são as coisas.
Por que veríamos nós uma coisa se houvesse outra?
Por que é que ver e ouvir seria iludirmo-nos
Se ver e ouvir são ver e ouvir?

O essencial é saber ver,
Saber ver sem estar a pensar,
Saber ver quando se vê,
E nem pensar quando se vê
Nem ver quando se pensa.

Mas isso (tristes de nós que trazemos a alma vestida!),
isso exige um estudo profundo,
Uma aprendizagem de desaprender
E uma sequestração na liberdade daquele convento
De que os poetas dizem que as estrelas são as freiras eternas
E as flores as penitentes convictas de um só dia,
Mas onde afinal as estrelas não são senão estrelas
Nem as flores senão flores,
Sendo por isso que lhes chamamos estrelas e flores.

Não sei o que é a Natureza: canto-a.
Vivo no cimo dum outeiro
Numa casa caiada e sozinha,
E essa é a minha definição.

Anónimo disse...

[comentando por ordem, ainda que se possa perder alguma coerência]

não chamem pai a outro:

Da COMMONWEALTH fazem parte países autónomos, por vontade própria. Ainda que o Reino Unido possa exercer algum tipo de pressão, mas nada comparado às antigas colónias europeias.
O Vietname deixou de ser uma colónia francesa durante a 2ª Guerra Mundial.

Quando utilizei o ‘nós’ (erradamente e peço desculpa), não me referia à população geral portuguesa, com certeza!, mas sim aos estadistas que fizeram o favor de construir um muro à volta de Portugal (“orgulhosamente sós”).

Não me parece que a política da altura fosse agradar o povo, mas cegar. O povo podia andar feliz (no início do Estado Novo), porque andava cego. (E podia remeter para Fernando Pessoa: a ceifeira é feliz porque não pensa). Digamos que o governo até tinha boa intenção (nos primeiros anos)… isso nunca justificaria os quase 50 anos de censura e manipulação.


_________,,_________

pablo chicasso e andy cap:

A intenção do artista só ele a sabe realmente.

pablo chicasso, quando falei do ‘propósito’ da exposição não me referia ao Galvão, mas à exposição em si, à intenção implícita na permissão da exposição das fotografias.

andy cap, confesso que não conheço o fotógrafo e, por isso, a minha resposta ao teu (seu?) ‘desafio’ não será talvez a esperada. Talvez o fotógrafo quisesse fotografar apenas corpos, talvez uma cultura, talvez fazer uma crítica. Não sei. Tenho uma noção em que contexto ele, fotógrafo, se inseria, em termos globais, históricos e sócio-políticos, mas não sei nada sobre a sua vida e outros trabalhos, sobre a sua própria história e inserção na sociedade. Isso restringe naturalmente a minha resposta que anda completamente perdida em suposições de suposições. As fotografias, em concreto, transmitem-me (subjectiva e parcialmente) uma ideia de paz, fuga do mundo urbanizado e estandardizado, que todos procuramos por vezes, nem que seja nos nossos próprios sonhos (conscientes). A sequência das imagens faz-me lembrar a primeira cena do filme “Barreira Invisível” (“The Thin Red Line”) de Terrence Malick. Sei que fugi à questão, mas falei do que podia..
Em relação ao poema de António Gedeão, lembrei-me da World Press Photo e de um comentário de um colega que criticou os fotógrafos (e jornalistas, em geral) que tiram fotografias à desgraça dos outros, em vez de os ajudarem, naquele momento. Não pude deixar de concordar com ele, mas por outro lado, o papel deles é fazer chegar-nos a informação/a realidade e, se não houvesse quem o fizesse e corresse esses riscos, o mundo seria repleto de países, cidades, isolados. O que eu apresentei no meu primeiro comentário não era referente a esta ideia, mas sim à manipulação, não da imprensa (naquele caso), mas de um Estado Autoritário.
Sobre o poema de Alberto Caeiro, não me atrevo a comentar… Como disseste (disse?), saboreei…



_________,,_________

não chamem pai a outro:

Continue o seu comentário, por favor. Apraz-me. Aprendo.

E vemos todos diferentemente, não é?

Anónimo disse...

Olá de novo, Joana!

Espero que não tenhas desistido de verificar se eu ainda voltava à nossa troca de ideias.
O trabalho levou-me para longe (fisicamente e para outros "campos mentais"), mas aqui estou de novo.

Antes de mais não penses que fiquei chateado por teres dito "nós". Não te respondi por isso - já tenho experiência suficiente para saber que era uma figura de retórica e, sobretudo, que "cada um arca com a responsabilidade do que faz e do que diz" -. Depois, eu até posso ser um "colonialista ferrenho" e estar a tentar "sacar" mais alguma coisa. - Descansa que não sou nada disso...

Entrei no assunto porque o teu comentário me pareceu "uma explosão" um enorme desabafo de alguém que tem muita coisa para dizer, já tentou expressar-se, mas tem "qualquer coisa" - algo ou alguém - que está como, o outro, sempre a dizer-lhe: "pst'cala-te"... Ou - talvez o mais certo - seres uma jovem cheia de energia e com vontade de mudar o Mundo...

Quando isso acontece as ideias vêm todas ao mesmo tempo e saem misturadas.


Por isso as citações

O poema chama-se "TROVAS PARA SEREM VENDIDAS NA TRAVESSA DE S. DOMINGOS", é do António Gedeão e está no livro "MÁQUINA DE FOGO" de 1961.

<1> Observação:

O repórter fotográfico foi ver a fuzilaria...

foi ver coisas - "o que nós vemos das coisas são as coisas"

<2> “Neutralidade da observação”

Continuo a pôr aspas porque, infelizmente, as coisas não podem pôr-se de modo simples: é por isso que

“Não basta abrir a janela
Para ver os campos e o rio
Não é bastante não ser cego
Para ver as árvores e as flores.
É preciso também não ter filosofia nenhuma.”

- E todos nós temos a nossa filosofia (=a nossa maneira de pensar, a nossa formação anterior, os nossos problemas pessoais, a educação, que nos levam a construir o nosso pensamento pré-concebido – ou seja o nosso pré-conceito, mais conhecido por preconceito.)

Aquelas fotos do Alvão (não questiono se são ou não são do Alvão) mostram o que lhe estava à frente da máquina. Aqui o repórter fotográfico foi ver as populações nativas de África. E nem é importante saber se era nos territórios portugueses (na época).

Por isso

O essencial é saber ver,
Saber ver sem estar a pensar,
Saber ver quando se vê,
E nem pensar quando se vê
Nem ver quando se pensa.

Se eu estiver a pensar ao mesmo tempo que estou a ver aquelas fotografias corro o risco de influenciar (=a corromper) a minha “observação” com o(s) pensamento(s) que tinha (pré-concebidos – isto é formulados antes de ver as fotos)

<3> A Informação

O Povo diz na sua sabedoria que quem conta um conto acrescenta-lhe um ponto

A transmissão da informação não é uma coisa fácil.
Os dados têm de ser trabalhados (por isso se pode dizer “manipulados” com a maior e mais pura das inocências), para ser depois transmitida a informação que eles contêm (ou que neles está consubstanciada).

E ai começa a manipulação da informação. às vezes de modo inocente.

(Repara: sem qualquer mácula ou má ou escondida intenção os dados recolhidos são manipulados, daí resultando uma informação (muitas vezes mais do que uma, porque quem lê os dados tem uma forma de ver as coisas que lhe é própria) que é transmitida de uma maneira que tem de ser trabalhada (manipulada, ela também) produzindo resultados que (porque vão ser “lidos” por pessoas com formação diferente) muitas vezes são o contrário do que se queria dizer.

Um exemplo simples e também inocente:

as palavras: as crianças, alegrias, trabalho, dão, mas, também, muito, muita

podem ser agrupadas de modos diferentes dando informações diferentes e, neste caso, podem até influenciar o ambiente, conforme o modo como são articuladas:

i.) as crianças dão muita alegria, mas também dão muito trabalho!
ii.) as crianças dão muito trabalho, mas também dão muita alegria!

As palavras são as mesmas, a pontuação é a mesma, mas a primeira mensagem é pessimista e a segunda é optimista....

Um outro exemplo, de uma brincadeira da resistência de antes do 25 de Abril:

Certa noite a polícia prendeu um homem que estava a pintar esta frase num muro:

VAMOS MANDAR PRENDER SALAZAR NÃO FAZ FALTA À NAÇÃO

O homem, no entanto, disse-lhes que havia um mal entendido. E pediu que o deixassem pontuar a frase:

VAMOS MANDAR PRENDER SALAZAR? NÃO! FAZ FALTA À NAÇÃO!

É um bocado por causa de coisas como esta que não sei como reagir perante os prémios WORLD PRESS PHOTO e outros. E também não sei “apreciar” certo fotojornalismo actual ( e certas reportagens de TV). Porque não sei se estou a ver o que o jornalista viu ou se o que me é apresentado é uma encenação, para ficar bem na fotografia.
(Na poesia o António Gedeão dá a entender – muito subtilmente – que o que interessa não é ver a fuzilaria, mas “apanhar o momento sensacional, sem respeito pelo sofrimento alheio” (agora dir-se-á “com objectividade”, pff!): “A hora é sensacional...”
“vá lá, vá lá, felizmente,/felizmente que ao chegar/inda havia muita gente/que estava por fuzilar”......

Mas isso de estar bem informado e ter uma visão clara do mundo que nos rodeia, quando há tantos interesses a quererem controlar a nossa opinião (e o nosso voto) é uma tarefa muito muito difícil:

(...O essencial é saber ver,
Saber ver sem estar a pensar,
Saber ver quando se vê,
E nem pensar quando se vê
Nem ver quando se pensa.)

Mas isso (tristes de nós que trazemos a alma vestida!),
isso exige um estudo profundo,
Uma aprendizagem de desaprender

E também não podemos isolar-nos deste mundo, porque:

“Com filosofia não há árvores: há ideias apenas.
Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;
E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse
Que nunca é o que se vê quando se abre a janela.”

Por isso tudo é muito importante ter estudantes que se preocupam em SABER em SER CULTOS, em APRENDER, para que haja gente com aquela CAPACIDADE DE APRENDER A DESAPRENDER - ou seja gente capaz de apreciar a informação que lhe aparece pela frente - sob a forma de jornal, de filme, de livro, de informação verbal, de discurso político,... - e "desconstruí-la" (depois de a ver ou depois de a ouvir, pensar o que viu ou ouviu) e formar uma opinião verdadeiramente sua!

VIVA O ESPÍRITO CRÍTICO!!!!